As Associações e o governance das mesmas é um tema que tem tanto de relevante como de injusto para quem sobre ele se debruça: se, por um lado, a falta de regulamentação permite quase tudo, por outro a mesma poderá tornar-se problemática aquando do momento de tomada de decisões, especialmente quando em causa estão associações menos profissionalizadas.
Assim, é necessário recordar que as Associações se encontram reguladas no velhinho Código Civil (CC) e, portanto, há algumas questões e problemáticas que, agora se colocam e devem ser atendidas, à data não se colocavam. De tal modo que é necessário recorrer tanto a soft law como ao Código das Sociedades Comerciais (CSC) para garantir que o governance associativo é o mais eficiente e transparente possível.
Feita esta introdução, importa analisar o que o CC prevê como obrigatório para a organização das Associações e, a partir dessa análise, perceber à luz das regras de boa governança, o que se torna ou não relevante importar de outros regimes. Destarte, as Associações, qualquer que seja a sua atividade, têm de ter um órgão de administração e um órgão de fiscalização.
O órgão de administração – tipicamente conhecido como a Direção – terá de ser composto por um número ímpar de pessoas, sendo um dos membros o Presidente, a quem caberá, no caso de não estarem reunidos todos os membros numa tomada de decisão, voto de desempate. Por outro lado, o órgão de fiscalização poderá ser um de dois: ou um fiscal único ou um conselho fiscal, aplicando-se a este último as regras supra (1).
A par destes, existe a Assembleia Geral, composta por todos os associados que, reúne obrigatoriamente uma vez por ano e extraordinariamente, quando convocada pela administração ou quando for requerida por um ou mais associados, numa de duas situações: ou no caso de a administração a dever ter convocado e não o ter feito ou por um conjunto de associados não inferior à quinta parte dos mesmos, nos termos do artigo 173º do CC, quando estes o considerem necessário fazê-lo para deliberar sobre um fim legítimo.
Antes de avançarmos com uma visão geral sobre a competência dos diferentes órgãos, parece-nos imperativo esclarecer algumas questões que muitas vezes assombram as Associações no momento da escolha dos elementos a integrar nos diferentes órgãos, especialmente no que concerne à Direção, socorrendo-nos para tanto de know-how resultante de outras fontes.
Sobre este tema há três questões centrais, que nos parece relevante abordar no presente: (i) a primeira é sobre se os órgãos sociais podem ou não ser compostos por pessoas que não sejam associados, (ii) a segunda tem que ver com o facto de os órgãos sociais serem ou não remunerados e, por fim, (iii) qual o vínculo existente entre o membro do órgão social (em especial, da Direção) e a Associação.
Esclarecemos que não há qualquer obrigação em que os membros dos órgãos sociais sejam associados, podendo, portanto, a administração da associação ser assegurada por outros elementos. De resto, apontamos que esta solução poderá garantir a separação dos poderes: associado versus administração, o que poderá ser benéfico em algumas situações. Em opinião diversa, há quem considere que a obrigatoriedade de os membros da Direção serem associados permite garantir que a missão da Associação e o que motivou a constituição da mesma é assegurado. Assim, esta decisão deverá ser necessariamente alvo de uma reflexão por parte dos Associados fundadores, à luz do que os mesmos pretendem assegurar, sendo importante uma ponderação de interesses, que só poderá ser feita pelos mesmos e in casu.
Por outro lado, sobre a remuneração dos órgãos sociais, não nos parece que exista algum impedimento a que o órgão de administração seja remunerado (2), podendo, desse modo, os estatutos prever a remuneração ou não do mesmo e, bem assim, a Assembleia Geral deliberar pela remuneração ou não dos mesmos.
Finalmente, deixar uma nota sobre o vínculo a estabelecer entre a Associação e o membro da Direção. Parece-nos que a acumulação de vínculos deverá ser de evitar, isto é, a mesma pessoa não deverá ser trabalhadora e administradora da Associação, mobilizando para tal o que prevê o CSC sobre a acumulação destas funções, no âmbito das sociedades anónimas. Ressalvamos, todavia, que poderá haver situações concretas em que a manutenção das duas funções poderá fazer sentido, mas que tal não deve ser regra nem abranger a maioria dos membros do órgão.
Uma última nota (que será, posteriormente, melhor desenvolvida) para as competências dos órgãos: apontando que a Direção deve administrar a vida quotidiana da Associação, sendo tal administração fiscalizada pelo órgão de fiscalização; a Assembleia Geral, por sua vez, tem competência subsidiária, salvo em relação ao expressamente previsto no número 2 do artigo 172º do CC e em relação ao que às competências que os estatutos lhe conferirem.
(1) Nos termos do artigo 171º, número 1, in fine do CC, tanto o órgão de administração como o conselho fiscal apenas podem reunir se presente a maioria dos seus membros. Assim, o legislador impõe tanto um quórum constitutivo como deliberativo.
(2) Notamos que a presente matéria será devidamente revisitada, posteriormente, à luz da legislação aplicável a Instituições de Solidariedade Social.