Foi publicada a 12 de janeiro de 2024 a Resolução do Conselho de Ministros nº14/2024, a qual aprova o Plano de Ação do Envelhecimento Ativo e Saudável 2023-2026.
Considero que dificilmente um plano que se foca no envelhecimento, em lugar de se focar na longevidade, conseguirá mudar o paradigma existente. Conforme refere a Estratégia Europeia para as Pessoas Idosas publicada em julho de 2023 pelo Comité Economico e Social Europeu: “As novas políticas da UE devem conduzir a uma mudança de paradigma, dando visibilidade às pessoas idosas, substituindo a visão assistencial pela da capacitação e eliminando as visões idadistas”.
Qual é o paradigma existente e porque é necessário mudar?
O atual paradigma da sociedade assenta num modelo ultrapassado, em que a sociedade é construída em função de uma pirâmide demográfica que já não existe. O Plano de Ação reconhece que o aumento da esperança de vida não se fez acompanhar de melhoria de bem-estar. Mas, em vez de se focar na visão da longevidade e na necessidade de capacitação que as pessoas precisam para a preparação da sua reforma, assenta numa visão de envelhecimento.
O envelhecimento é um processo inevitável que começa no nascimento. A longevidade é uma conquista civilizacional que permite às pessoas a possibilidade de viver muitos anos depois da reforma. Em Portugal, vive-se menos do que na maioria dos países europeus, mas o facto é que há hoje a possibilidade de vivermos cerca de um terço da nossa vida depois de atingir os 65 anos. Perante esta expectativa de vida, temos necessidade de nos prepararmos para viver vidas longas.
O cerne da questão
Importa, pois, atuar e preparar a sociedade que se encontra em progressiva evolução de envelhecimento. Então, como nos devemos preparar? Como planear e preparar a reforma? Poderemos manter o nível de vida com o qual vivemos durante a vida ativa? Terão as pessoas suficiente literacia financeira para saber poupar, investir e financiar a sua reforma?
Infelizmente, não. O Eurobarómetro publicado em julho de 2023 mostra que Portugal ocupa, em matéria de conhecimento financeiro, o penúltimo lugar dos países europeus.
A pergunta que se impõe é: como pode o Plano de Ação ignorar que as competências financeiras e digitais são essenciais para capacitar as pessoas a planear e preparar a reforma para não serem conduzidas a processos de empobrecimento e exclusão social?
A exclusão assume inúmeras dimensões, mas a primeira forma é a da exclusão financeira e digital. É necessário promover a educação financeira, transferir conhecimento, mudar atitudes e comportamentos para que as pessoas possam tomar decisões seguras e financeiramente corretas.
Lacunas do Plano de Ação
A análise do Plano mostra que este défice de literacia financeira dos mais velhos não é tido em conta. O Plano assenta em 6 pilares, dos quais vou analisar os Pilares III, V e VI, pois são os que deveriam incluir a formação financeira.
PILAR III – Desenvolvimento e aprendizagem ao longo da Vida.
As medidas aqui focadas são: formação inicial para aquisição de competências (não diz quais), capacitação digital (medida 4) e apoio de programas da sociedade civil, como as Universidades seniores, entre outras. Se a capacitação digital é importante, não menos importante é a formação financeira, a qual cria nas pessoas consciência, conhecimento e competências que lhes permitem atitudes seguras e comportamentos financeiros corretos. Deveria estar aqui incluída a educação financeira.
PILAR V – Rendimentos e Economia do Envelhecimento
Reconhece que é necessário garantir rendimentos adequados ao longo da vida, com especial enfase após a idade da reforma para permitir combater a pobreza e satisfazer as necessidades dos idosos. Mas, é evidente que não chega garantir rendimentos para combater a pobreza. O que é necessário é dar formação financeira às pessoas, para que possam gerir, de forma sustentada, a sua reforma.
O subpilar II do Pilar V apresenta como medida a tomar o empreendedorismo sénior. Mas como promover o empreendedorismo, sem promover capacitação financeira? Deveria ter sido acrescentada uma medida - a formação financeira, porque é impossível incentivar o empreendedorismo sénior, sem formação financeira.
PILAR VI – Participação na sociedade
Foca o empoderamento dos séniores. Mas, as atividades referidas não promovem o empoderamento. O que se apresenta são atividades de lazer, tais como a participação em ensaios gerais, coros, teatro, oficinas, museus, etc…
O que falta? Atividades de capacitação, essas sim, fatores de transformação positiva individual e social! Deveria ter sido acrescentada como medida a promoção da literacia financeira a qual se materializaria através de cursos de educação financeira.
Em conclusão: a legislação só será um elemento transformador se nela for incluída a capacitação das pessoas, nomeadamente a formação financeira e digital. Para as pessoas poderem planear e preparar a reforma é crucial serem digitalmente mais competentes e financeiramente mais capacitadas.